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Arquivo Municipal Alfredo Pimenta: Histórias e Memórias Familiares

(Artigo 5)

Alexandra Marques
Arquivo Municipal Alfredo Pimenta

Hoje em dia falamos muito da importância da memória coletiva, da memória local, da memória nacional, de memórias, mas afinal o que é a memória, que relevância a memória tem nas nossas vidas?

E se um dia acordássemos de manhã e não nos lembrássemos de nada, nada nos fosse familiar, nem o quarto, nem a casa, nem a nossa família? Possivelmente, sentir-nos-íamos confusos, perturbados, desesperados, faríamos mil perguntas. Quem somos? De onde viemos? O que nos teria acontecido? Estaríamos a sonhar? Mas não conseguiríamos responder a nada, o vazio teria assombrado a nossa mente, não haveria qualquer memória.

No dia-a-dia, não percebemos a importância que a memória tem na formação da nossa vida em sociedade e só a conseguimos valorizar se refletirmos sobre como seria se a não tivéssemos.

Para Le Goff (2003, p. 419), memória é um fenómeno individual e psicológico que se liga à vida social. Varia em função da presença ou ausência da escrita e é objeto da atenção do Estado que, para conservar qualquer acontecimento do passado, produz diversos tipos de documentos, faz apreensão da memória e depende do ambiente social e político.

Livro de óbitos da paróquia de Nossa Senhora da Oliveira

Deste modo, várias pessoas questionam-se sobre a importância da existência de arquivos: “Os arquivos são importantes para o estudo da história (…) “Os arquivos protegem os direitos dos indivíduos e proporcionam transparência (…) Os arquivos da administração local protegem os direitos dos cidadãos e fazem parte da identidade local (…)” — Bruce Dearstyne (1988).

Versar sobre a preservação da memória, sobre a valorização do passado e seus legados é, inevitavelmente, falar da importância dos Arquivos como guardiões da memória de um povo, de uma instituição ou de um indivíduo, mas também como fonte de pesquisa para todos os ramos do saber, como um espaço de referência da produção do conhecimento.

A vida quotidiana reflete-se nos documentos produzidos pela administração pública, que falam de nós e dos outros, através dos registos administrativos das ações que produzem e que estão guardados e disponíveis nos Arquivos. É nos arquivos que encontramos as fontes confiáveis de informação, que estão acessíveis a todos os cidadãos. A relação entre memória e arquivo é imprescindível. Os Arquivos são os pilares da memória e têm como função mantê-la viva.

E é exatamente esta a posição estratégica do Arquivo Municipal Alfredo Pimenta (AMAP), um Arquivo vivo, único no país, com funções de Arquivo distrital para a área do concelho de Guimarães, que conserva a nossa memória, a nossa história, a nossa cultura, os nossos documentos e produz e divulga conhecimento atual sobre temas, por vezes esquecidos, mas urgentes de serem avivados, lembrados, recordados e valorizados.

Ao longo dos anos, várias iniciativas têm sido levadas a cabo pelo AMAP, desde exposições, publicações, oficinas educativas, restauro de documentos, até ao “Arquivo Digital”, projeto que visa a democratização do acesso à informação e documentação que custodia, nomeadamente às informações genealógicas, que muito impactaram a expansão da genealogia.

Livro do Recenseamento Militar do Concelho de Guimarães

Hoje em dia, o estudo da história das famílias e das suas origens, deixou de ser, unicamente, uma área de interesse das famílias aristocratas, que desvelavam os registos genealógicos para documentar a sua linhagem e herança e passou a despertar a atenção e a curiosidade do cidadão comum, que quer dar voz aos seus antepassados anónimos, reconstruindo as suas histórias de vida.

Neste sentido, o Arquivo Municipal Alfredo Pimenta desempenha um papel crucial, pois disponibiliza online, documentos históricos que revelam informações valiosas sobre as relações familiares de todos aqueles que nasceram, casaram, viveram ou faleceram em Guimarães. Aqui podemos encontrar as fontes primordiais para o estudo genealógico: os assentos de batismo/nascimento, de casamento e de óbito, registados nos livros paroquiais das 80 freguesias que faziam parte do concelho de Guimarães, ou nos livros da Conservatória de Registo Civil de Guimarães.

Mas, à medida que se vai conhecendo os antepassados e construindo a árvore genealógica, a curiosidade sobre os familiares vai-se aguçando, o nome e a naturalidade tornam-se vagos e superficiais, queremos saber mais sobre as suas histórias de vida, que profissões tiveram, que conquistas alcançaram, que desafios enfrentaram, quais as suas tradições, ou seja, informações que nos permitam enriquecer e fortalecer o senso de identidade familiar.

E voltamos novamente aos Arquivo, onde poderemos ter acesso a outras fontes documentais manuscritas que nos permitem enriquecer as biografias dos nossos antepassados. Estamos a falar dos livros de notas dos cartórios notariais que contêm informações sobre transações, como vendas de terras, contratos, inventários, testamentos, procurações, dos processos de inventários orfanológicos, que escondem informações minuciosas sobre os membros da família, sobre os bens móveis e imoveis, documentação custodiada pelos Arquivos Distritais, que no caso do concelho de Guimarães se encontram disponíveis no AMAP.

Além destas fontes indiretas, existem outras, de suma importância, especialmente os livros de recenseamento geral da população, fonte de informação riquíssima para a demografia e genealogia, pois esclarecem-nos sobre o nível de escolaridade, as profissões, as rendas, as condições da habitação, ou seja, sobre as condições de vida. No AMAP podem, ainda, encontrar os livros de recenseamento militar, cédulas de recenseamento militar, os registos de emigração, boletins de ocorrências policiais, alguns registos de passaporte e obter descrições físicas, como a altura, a cor dos olhos, a cor do cabelo, dados que nos permitem uma compreensão mais visual dos nossos antepassados.

Explorar estas e outras fontes arquivísticas é uma experiência que todos, em algum momento da nossa vida, deveríamos vivenciar para enriquecermos o conhecimento da nossa história, da nossa cultura da nossa identidade.

É necessário que cada um de nós, como cidadãos que somos, pensemos que os Arquivos são essenciais à memória de um povo, e que é nosso dever contribuir para a sua plenitude. Preservar, difundir e disponibilizar a informação e documentação são tarefas de grande prioridade, quer para a geração presente, quer para as futuras gerações.

Nunca nos devemos esquecer que a ação de hoje é a memória do amanhã!

 

Arquivos, um instrumento privilegiado para assegurar a vida colectiva e individual

— Madalena Garcia in «Os Arquivos Serão o Homem Quiser» (Notícias de Guimarães, 02.07.93, pág. 7)

 

Fachada do edifício do Arquivo Alfredo Pimenta

Alexandra Marques — Arquivo Municipal Alfredo Pimenta

BIBLIOGRAFIA

 

LE GOFF, Jacques – História e memória. São Paulo: Unicamp, 2003.

COOK, Terry – Arquivos Pessoais e institucionais: para um entendimento arquivístico comum da formação da memória em um mundo pós-moderno. Estudos históricos: Rio de Janeiro, v. 11, n. 21,1998.

DEARSTYNE, Bruce W. – The Management of Local Government Records: A Guide for Local Officials. Sage Publications Lda, 1998.